O músico, compositor, escritor, sintetista e soundscape ecologist Bernard L. Krause nasceu na cidade de Detriot (Michigan/USA), no dia 8 de dezembro de 1938. Seus primeiros passos na música foram ainda na infância: Bernie começou a estudar violino aos 3 anos de idade e com apenas 4 anos ele passou a estudar composição clássica! Nos anos seguintes, ele aprendeu a tocar vários outros instrumentos de cordas (viola, violoncelo, contrabaixo, harpa), mas foi na adolescência que ele descobriu o instrumento que mais gostava de tocar naquela época, a guitarra, e foi justamente tocando guitarra que ele começou sua carreira como músico profissional, tocando como músico de estúdio em gravações de jazz e também nas primeiras gravações da Motown (sim, o lendário selo de soul music). Aos 25 anos - em 1963 -, Bernie juntou-se a banda de folk The Weavers, tocando com eles até que o grupo se desfez, no início de 1964.
Mais tarde naquele mesmo ano, Bernie Krause se mudou para San Francisco (California), com a intenção de estudar música eletrônica no Mills College, numa época em que compositores como Karlheinz Stockhausen e Pauline Oliveros realizavam palestras e concertos naquela instituição. Foi também nesta época que, praticamente ao mesmo tempo, os engenheiros eletrônicos Robert Moog e Don Buchla estavam começando a mostrar ao mundo as suas primeiras criações: os sintetizadores Moog e Buchla, respectivamente. Claro que Bernie interessou-se pelo novo instrumento e seu interesse o levou ao encontro de outro grande nome da história dos sintetizadores: Paul Beaver. Beaver & Krause trabalharam juntos em seu estúdio em Los Angeles, participaram de muitas gravações de outros artistas e bandas, criaram música e paisagens sonoras para muitos filmes e gravaram cinco álbuns de enorme importância: The Nonesuch Guide to Eletronic Music (1968), Ragnarök (1969), In a Wild Sanctuary (1970), Gandharva (1971) e All The Good Men (1972).
Após a morte de Paul Beaver (em 1975), Bernie passou a ter um interesse maior em dar continuidade às suas gravações de paisagens sonoras do que na programação de sintetizadores. Ele começou a gravar os sons da natureza nos anos 60, tanto para usar em seus álbuns quanto em trilhas sonoras para filmes e também para o The Krause Natural Soundscape Archive, uma enorme coleção que consiste em mais de 4,500 horas de sons gravados de mais de 15,000 espécies, marinhas e terrestres! No final dos anos setenta Bernie completou seu Ph. D. em bioacústica no Union Institute and University, em Cincinatti. Ele é autor de quatro livros e muitos artigos, principalmente sobre seu trabalho de gravação de paisagens sonoras e tem mais de 50 discos com sons da natureza disponíveis para download!
Meu primeiro contato com Bernie foi via facebook, quando eu perguntei se ele aceitava fazer esta entrevista. Ele foi muito gentil e gentilmente aceitou meu convite, me pedindo para escrever um e-mail para Katherine Krause (sua esposa), para que ela pudesse transmitir-lhe a mensagem e assim ele responderia às minhas perguntas. E aqui está, é com muito orgulho que posto esta entrevista com o grande Dr. Bernie Krause, exatamente no dia do seu aniversário de 74 anos de idade! Feliz aniversário, Dr. Bernie Krause e muito obrigado por me dar a oportunidade de tê-lo entrevistado aqui no meu blog!
Bernie and the Moog synthesizer (photo by Jon Sievert) |
ASTRONAUTA - Bernie, como foram os seus primeiros passos no mundo musical e como você se interessou pela guitarra elétrica e, depois disso, pelos sintetizadores e pela música eletrônica?
BERNIE - Como eu não enxergo muito bem, minhas informações sobre o mundo chegam principalmente pelo som. Então, naturalmente, quando eu era criança, passei a estudar música, indo violino para composição. Quando me tornei adolescente, eu mudei para guitarra (quando os hormônios chamaram) porque... bem, você sabe. Quando eu tinha 25 anos de idade, entrei para um grupo folk muito famoso nos Estados Unidos, chamado The Weavers. Depois que a banda se separarou, no início de 1964, eu me mudei de New York para a California e passei a estudar música eletrônica no Mills College, em Oakland, que na época era a principal instituição de técnicas experimentais. Enquanto estava lá, eu conheci o Paul Beaver, que se tornou meu parceiro musical e, juntos, ajudamos a introduzir o sintetizador Moog na música pop e no cinema, tanto na Costa Oeste (dos Estados Unidos) quanto no Reino Unido.
ASTRONAUTA - Você conheceu Robert Moog e Don Buchla logo nos primeiros dias da invenção do sintetizador. Como foi fazer parte desta emergente cena, que mudou muito a música e os métodos para a composição, criação e execução musical? E sobre o Paul Beaver, como você o conheceu e como vocês tiveram a idéia de gravar "The Nonesuch Guide to Electronic Music" (1968)?
BERNIE - Como eu não enxergo muito bem, minhas informações sobre o mundo chegam principalmente pelo som. Então, naturalmente, quando eu era criança, passei a estudar música, indo violino para composição. Quando me tornei adolescente, eu mudei para guitarra (quando os hormônios chamaram) porque... bem, você sabe. Quando eu tinha 25 anos de idade, entrei para um grupo folk muito famoso nos Estados Unidos, chamado The Weavers. Depois que a banda se separarou, no início de 1964, eu me mudei de New York para a California e passei a estudar música eletrônica no Mills College, em Oakland, que na época era a principal instituição de técnicas experimentais. Enquanto estava lá, eu conheci o Paul Beaver, que se tornou meu parceiro musical e, juntos, ajudamos a introduzir o sintetizador Moog na música pop e no cinema, tanto na Costa Oeste (dos Estados Unidos) quanto no Reino Unido.
ASTRONAUTA - Você conheceu Robert Moog e Don Buchla logo nos primeiros dias da invenção do sintetizador. Como foi fazer parte desta emergente cena, que mudou muito a música e os métodos para a composição, criação e execução musical? E sobre o Paul Beaver, como você o conheceu e como vocês tiveram a idéia de gravar "The Nonesuch Guide to Electronic Music" (1968)?
BERNIE - Aqueles primeiros tempos (dos sintetizadores) analógicos eram muito emocionantes porque o instrumento tornou-se um ímã para muitos dos grandes artistas da época e todos eles passavam pelos nossos estúdios, em Los Angeles ou em San Francisco, para trabalhar e conviver. (Sobre a segunda parte da sua pergunta, veja a resposta à número 1, acima).
Bernie, Beaver and their Moog III synthesizer (1967) |
BERNIE - Na maior parte do tempo, depois de introduzirmos o sintetizador nos estúdios de Los Angeles e do Reino Unido, estávamos constantemente ocupados - nós trabalhavamos muitas vezes por até 80 horas por semana e ficávamos vagando como zumbis, de estúdio em estúdio nestas cidades, trabalhando. Quase não dormiamos e embora tenhamos tocado nas gravações de muitos artistas e também em muitas trilhas sonoras de filmes, apenas alguns poucos se destacam como memoráveis. O texto seguinte é um trecho do meu livro de 1998, intitulado "Into a Wild Sanctuary: A Life in Music and Natural Sound"e relata uma experiência - atípica porém notável - com o falecido George Harrison:
San Francisco, Novembro de 1969. Uma noite, já tarde, eu peguei o telefone e ouvi a voz de George Harrison do outro lado da linha. Ele ligou para perguntar se eu poderia ir a Londres, levar um sintetizador Moog comigo e ensiná-lo a tocar. Paul Beaver e eu já tinhamos vendido um para George Martin e outro para Mick Jagger. Harrison - que um mês antes tinha me pedido para tocar sintetizador no disco do Jackie Lomax, que ele estava produzindo e gravando no Armin Steiner's Sound Recorders em Hollywood - tinha que ter um, disse ele, e queria isto imediatamente. Ele não queria ser superado pelos seus amigos.
Depois de encerrada a sessão com o Lomax, Harrison pediu-me para ficar mais um pouco e demonstrar as configurações do Moog que eu tinha utilizado na gravação e também outros sons possíveis. Já era bem tarde, por volta de 3 da madrugada, e eu havia vindo de San Francisco cedo no dia anterior. Eu lhe disse que estava cansado e que eu precisava voltar na manhã seguinte para uma sessão agendada, mas que ficaria por uma hora. Eu estava exausto e não percebi que ele havia ordenado para que o engenheiro mantivesse um gravador rodando e tudo o que eu demonstrava estava sendo gravado. Se eu soubesse que isso estava acontecendo, nunca teria mostrado exemplos do que Paul e eu estávamos trabalhando para o álbum da Warner Brothers que estávamos planejando ("Gandharva"). Como eu demonstrei a ele as configurações e dei exemplos de como tocar, Harrison obviamente pareceu impressionado com as possibilidades. Eu não tinha idéia no momento do quanto ele estava impressionado exatamente.
No final da demonstração George me perguntou quando ele poderia ter um Moog III enviado para Londres. Eu disse que ele poderia tê-lo 30 dias depois de recebermos um depósito de 50 por cento do valor. Ele me lembrou, pela primeira de inúmeras vezes, de que ele era um Beatle no final das contas e que a Apple Music Organization geralmente não fazia depósitos antecipados. Tentando manter a calma, respondi que, assim que eu recebesse um cheque com o depósito da Apple e sacasse o dinheiro no banco, um sintetizador estaria a caminho dentro de um mês. Ele perguntou se poderíamos mudar o acordo para ele - de novo, porque ele era um Beatle. Eu disse a ele que não haviam exceções - até mesmo para a Rainha.
Depois de meses de silêncio, houve outra chamada tarde da noite, era Harrison perguntando onde estava o seu sintetizador. Sentindo que eu estava falando com um idiota, mais uma vez repeti os termos. Finalmente pronto para pegar para o instrumento, George perguntou se eu iria pessoalmente viajar para Londres quando o instrumento fosse enviado, para ajudar na alfândega e para ensiná-lo para operar a máquina. Eu concordei, desde que ele pagasse minhas despesas e pelo meu tempo, imaginando que seria maravilhoso conhecer os outros membros da banda. Eu tinha ouvido a notícia de separação deles e queria experimentar a convivência com eles antes da estrofe final da ruína.
No início de janeiro, outra chamada veio de Harrison, desta vez dizendo que um depósito havia sido enviado e que eu deveria me organizar para ir a Londres para trabalhar com ele no momento em que o instrumento estivesse pronto. Falando como se estivesse se dirigindo a um escravo, ele nunca perguntou se era conveniente ou possível, ou se o momento era certo, ele só ordenou: "organize sua vinda." Ele reiterou que ele iria pagar pelas despesas, mas nada pelo meu tempo. "Você está vendendo a maldita coisa!" ele me lembrou. "Agora me mostrar como tocar!" Afinal, ele era um Beatle.
Uma passagem de primeira classe chegou pelo correio, que eu imediatamente troquei por duas passagens comuns, para que minha esposa Denise pudesse me acompanhar. Mesmo que não tivessemos filhos, ela nunca teve um emprego ou se ofereceu para ajudar em certos aspectos práticos de nossas vidas, embora arcar com todas as despesas tivesse sido, muitas vezes, um fardo muito grande para eu carregar sozinho e isto acrescentasse mais tensão para o nosso já conturbado casamento. Sem se preocupar com a forma como as questões práticas de nossas vidas seriam abordadas, quando chegou a hora de viajarmos, especialmente quando estávamos perto de Paris, onde ela cresceu, Denise estava sempre pronta para lucrar com as regalias. Na sexta-feira antes de sairmos, eu liguei para a secretária de Harrison, para confirmar a viagem. O escritório da Apple verificou todas as providências e disse que eu era esperado. Na primeira terça-feira de fevereiro de 1970, nós estavamos saindo de Los Angeles no vôo do meio-dia, pela TWA.
Sentados no corredor e no assento do meio da primeira fileira, logo atrás da área reservada à primeira classe de um antigo 707, tinhamos uma visão clara da cabine de primeira classe. Quando o avião se afastou do portão de embarque, uma passageira da primeira classe se levantou e começou a arrancar as roupas dela, gritando "o avião vai cair! Todo mundo fora porque o avião vai cair!" Robert Mitchum, que aparentemente estava sentado uma fileira atrás dela, levantou-se calmamente e envolveu um cobertor em torno da mulher, enquanto o avião retornava ao portão, para que o pessoal pudesse retira-la do vôo. Dory Previn, no pior momento da separação do seu marido, o maestro André Previn, sofreu um colapso mental que posteriormente a levou a um período que ela viria a escrever de forma tão eloquente mais adiante. A viagem começou de forma dramática nunca mudou.
Londres, Fevereiro de 1970. A Apple havia reservado um quarto no Dorchester Hotel. Como o hotel ficava a uma curta distância do escritório, depois de nos acomodarmos, eu caminhei sozinho para o santuário da Apple, para descobrir o que estava acontecendo. A rua mais parecia um circo, com muitas crianças zanzando em trajes diferentes, rindo com caras de bobos para quem passasse pelos portões sagrados. Quando entrei no escritório, fui primeiramente recebido pelo batalhão segurança, com um ar incrivelmente esnobe e indiferente. Parecia que ninguém sabia que eu era esperado ou o que eu estava fazendo lá, mesmo que eles tivessem encomendado o sintetizador, enviado a passagem e providenciado minha estadia em um dos melhores hotéis da cidade. Finalmente, depois de cerca de uma hora, alguém me disse que Harrison teve suas amígdalas removidas na sexta-feira anterior (dia que eu liguei para confirmar a viagem), e que ele estaria de recesso por cerca de uma semana. Eu tinha que me conformar, me disseram. Eles me chamariam quando George estivesse pronto.
Com muito trabalho programado na Califórnia, eu não tinha planejado ficar em Londres com Harrison por mais de uma semana e tive a sensação de que isso iria se transformar em uma grande provação para mim. Tendo finalmente localizado a assistente de Harrison, eu disse a ela que gostaria de ir para Paris, onde a adoentada madrasta da minha esposa estava vivendo e que eu poderia ser encontrado em um hotel particular. Dei-lhe o número de hotel em Paris e disse-lhe para me ligar quando Harrison estivesse pronto e capaz de me encontrar. Eu também deu o número para os gerente de negócio do Beatle, para um casal de secretários e para o recepcionista do Dorchester. Ciente de que eu tinha deixados todos a par de onde estaria, Denise e eu voamos para Paris.
Vários dias se passaram, eu nem me lembro quantos. Parecia que era muito tempo. As sessões programadas na Califórnia foram adiadas ou canceladas. A cada dois dias eu ligava pro escritório da Apple, para ver se havia alguma notícia. As respostas, curtas e grossas, eram sempre as mesmas: "Ele vai chamar quando ele estiver pronto." Finalmente, numa manhã depois de cerca de uma semana, alguém da Apple ligou: "Onde diabos você estava!?", uma voz de uma mulher muito desagradável e arrogante gritou do outro lado da linha. "George está sentado, esperando por você, durante dias", ela gritou no telefone. "Por que você não está onde deveria estar? E além disso, não estamos conseguindo retirar o sintetizador na alfândega e precisamos de ajuda porque eles não conseguem definir o que é aquela maldita coisa e certamente não pagaremos os impostos que eles querem nos cobrar!". Antes de desligar o telefone, eu disse à mulher do outro lado da linha que enfiasse a sua atitude onde o sol não brilha e me ligar de volta quando ela estivesse mais calma. Quando ela finalmente ligou de volta pedindo desculpas, eu deixei claro os termos necessários se eles quisessem minha ajuda com qualquer coisa e disse à assistente que eu estaria de volta em Londres dentro de dois dias.
Encontrando-nos no aeroporto de Heathrow, o pessoal da Apple nos levou diretamente à alfândega inglesesa, onde o instrumento ainda estava aguardando liberação. Fiz questão de pedir ao escritório da Apple para enviar um amplificador para o aeroporto, com o motorista, para que pudéssemos tocar o sintetizador ali mesmo, se fosse necessário. A sugestão salvou o dia. O problema, na perspectiva da alândega, era que o sintetizador ainda não estava categorizado ou entraria como componentes eletrônicos. A taxa de importação seria, portanto, uma soma exorbitante de cerca de 60 ou 70 por cento do valor. No entanto, se fosse um órgão eletrônico, o imposto cairia para algo abaixo de 10 por cento - uma economia enorme em um instrumento de 15.000 dólares. Eu perguntei ao agente da alfândega se eu poderia desembrulhar o sintetizador e demonstrar para ele. Com a sua aprovação, eu liguei o sintetizador no amplificador, pluguei alguns osciladores, rapidamente sintetizei um som de um órgão Hammond B-3 e começei a tocar algumas melodias. Ciente de que era apenas um órgão eletrônico, ele permitiu que a Apple pagasse o imposto exigido e liberou o instrumento para a entrada na Grã-Bretanha.
Mais tarde, naquele mesmo dia, dois carros chegaram ao hotel para levar minha esposa e eu, separadamente, à casa de George Harrison em Esher, um subúrbio nos arredores de Londres. Tão obscura era sua localização que o motorista foi estava com um rádio para que o nosso comboio pudesse "receber instruções" de como se locomover pelo labirinto de pequenas ruas, até chegar na casa. Na luz dos faróis, a fachada parecia com a de uma residência com pé direito baixo e no estilo campestre que combinaria melhor com locais nos arredores de Huston. Eu só ví de relance, mas a marca distintiva da casa era apenas a porta da garagem escandalosamente decorada com algum tipo de pintura psicodélica, parcialmente obscurecida pelas enormes Mercedes estacionados em frente - um pouco chamativo para alguém que supostamente desejada privacidade. A esposa de Harrison, Patty, mais conhecida então como uma modelo da revista Vogue inglêsa, abriu a porta e perguntou a mim e à Denise, que tinhamos chegado juntos, se gostaria de algo para comer.
Nós fomos levados à cozinha, onde George e Patty estavam fazendo uma grande salada. "Nós somos vegetarianos, você sabe. Nós não comemos carne e não gostamos de usar produtos de animais mortos." Depois de um curto descanso, George ofereceu a ponta obrigatória e nos levou por um corredor até a sala, imediatamente nos dirigindo para sentarmos no sofá central de couro, com 15 metros de comprimento, que dominava todo o espaço. Eu não me preocupei em perguntar de qual animal tinha vindo o couro para fabricar aquele o sofá. A sala era decorada sem nenhuma coesão, sem objetos pessoais óbvios e vários lixos desconexos estavam por todo o lado. Uma cadeira de couro com encosto aqui. Um pufe desconexo, lá. Algumas lâmpadas de assoalho iluminando tudo, com uma luz muito forte. Nada nas coisas que nós vimos na casa parecia confortável ou relacionadas dentro de um estilo, embora seja difícil de explicar com o que exatamente as pessoas se sentem confortáveis. Era tudo tão impermanente e me fez sentir um pouco deslocado. Havia um gravador multi-track desmontado em um canto da sala de estar (com partes da caixa de transporte ainda evidentes), e um gravador de duas pistas, ja ligado e com uma fita pronta para ser tocada. After a few more minutes I realized that the recording was taken from the Lomax demo session I had played for Harrison only a few months earlier O sintetizador Moog estava montado em uma parede, na frente do sofá de couro, as duas únicas coisas na sala que pareciam se relacionar. Qualquer tentativa de começar uma conversa era interrompida continua e constantemente por telefonemas e pessoas passando pela casa, distraíndo a estrela já sem foco para perguntar se ele queria comprar coisas como uma Mercedes ou uma Ferrari. Harrison parecia muito impressionado em ser o centro de toda a comoção. Finalmente, as coisas se acalmaram um pouco e ele voltou sua atenção para o sintetizador. "Antes de começarmos", ele disse, "Eu quero tocar algo para você que eu fiz no sintetizador. A Apple vai lançar nos próximos meses. É a primeira peça eletrônica que eu compus, com uma pequena ajuda de meus gatos". Ele apertou o botão "play" no gravador. No começo eu não reconheci o material. No entanto, pouco a pouco, a sensação foi se tornando cada vez mais desconfortável, fui percebendo que eu tinha ouvido isto antes. Depois de mais alguns minutos, percebi que a gravação tinha sido feita na a sessão de demonstração com o Lomax, na quel eu tinha tocado apenas alguns meses antes.
Mais tarde, naquele mesmo dia, dois carros chegaram ao hotel para levar minha esposa e eu, separadamente, à casa de George Harrison em Esher, um subúrbio nos arredores de Londres. Tão obscura era sua localização que o motorista foi estava com um rádio para que o nosso comboio pudesse "receber instruções" de como se locomover pelo labirinto de pequenas ruas, até chegar na casa. Na luz dos faróis, a fachada parecia com a de uma residência com pé direito baixo e no estilo campestre que combinaria melhor com locais nos arredores de Huston. Eu só ví de relance, mas a marca distintiva da casa era apenas a porta da garagem escandalosamente decorada com algum tipo de pintura psicodélica, parcialmente obscurecida pelas enormes Mercedes estacionados em frente - um pouco chamativo para alguém que supostamente desejada privacidade. A esposa de Harrison, Patty, mais conhecida então como uma modelo da revista Vogue inglêsa, abriu a porta e perguntou a mim e à Denise, que tinhamos chegado juntos, se gostaria de algo para comer.
Nós fomos levados à cozinha, onde George e Patty estavam fazendo uma grande salada. "Nós somos vegetarianos, você sabe. Nós não comemos carne e não gostamos de usar produtos de animais mortos." Depois de um curto descanso, George ofereceu a ponta obrigatória e nos levou por um corredor até a sala, imediatamente nos dirigindo para sentarmos no sofá central de couro, com 15 metros de comprimento, que dominava todo o espaço. Eu não me preocupei em perguntar de qual animal tinha vindo o couro para fabricar aquele o sofá. A sala era decorada sem nenhuma coesão, sem objetos pessoais óbvios e vários lixos desconexos estavam por todo o lado. Uma cadeira de couro com encosto aqui. Um pufe desconexo, lá. Algumas lâmpadas de assoalho iluminando tudo, com uma luz muito forte. Nada nas coisas que nós vimos na casa parecia confortável ou relacionadas dentro de um estilo, embora seja difícil de explicar com o que exatamente as pessoas se sentem confortáveis. Era tudo tão impermanente e me fez sentir um pouco deslocado. Havia um gravador multi-track desmontado em um canto da sala de estar (com partes da caixa de transporte ainda evidentes), e um gravador de duas pistas, ja ligado e com uma fita pronta para ser tocada. After a few more minutes I realized that the recording was taken from the Lomax demo session I had played for Harrison only a few months earlier O sintetizador Moog estava montado em uma parede, na frente do sofá de couro, as duas únicas coisas na sala que pareciam se relacionar. Qualquer tentativa de começar uma conversa era interrompida continua e constantemente por telefonemas e pessoas passando pela casa, distraíndo a estrela já sem foco para perguntar se ele queria comprar coisas como uma Mercedes ou uma Ferrari. Harrison parecia muito impressionado em ser o centro de toda a comoção. Finalmente, as coisas se acalmaram um pouco e ele voltou sua atenção para o sintetizador. "Antes de começarmos", ele disse, "Eu quero tocar algo para você que eu fiz no sintetizador. A Apple vai lançar nos próximos meses. É a primeira peça eletrônica que eu compus, com uma pequena ajuda de meus gatos". Ele apertou o botão "play" no gravador. No começo eu não reconheci o material. No entanto, pouco a pouco, a sensação foi se tornando cada vez mais desconfortável, fui percebendo que eu tinha ouvido isto antes. Depois de mais alguns minutos, percebi que a gravação tinha sido feita na a sessão de demonstração com o Lomax, na quel eu tinha tocado apenas alguns meses antes.
Um pouco confuso, finalmente encontrei a coragem para dizer "George, esta é a minha música - a mesma coisa que toquei, demonstrando o Moog na sessão com o Lomax em Los Angeles. Por que é que iesto está nesta fita e por que você está me mostrando isto como seu?""Não se preocupe", ele respondeu com segurança: "Eu editei isto e, se vender, vou enviar-lhe algumas libras." "Espere um minuto, George, você nunca me perguntou se você poderia usar este material. Ele pertence a mim e a Paul Beaver. E nós precisamos conversar sobre isso." Neste instante ele ficou com o rosto vermelho, as veias começaram a saltar ao longo de seu pescoço, e ele ficou furioso. Mesmo os Beatles não gostam de serem pegos. Beatles não estão acostumados a ouvirem "Não."
"Você está agindo como se fosse o Jimi Hendrix," ele respondeu, levantando a voz em tom e volume. "Quando Ravi Shankar vem à minha casa, ele é humilde". Então, para terminar a conversa e vendo que eu não estava impressionado com sua defesa, ele gritou a sua frase mais famosa: "Confie em mim, eu sou um Beatle!" Sem hesitar, eu calmamente me levantei, coloquei em meu casaco e pediu-lhe para chamar um carro para mim, porque eu tinha visto o suficiente e estava indo para casa. Enquanto esperava minha viagem de volta se materializar, ele teve a audácia de me perguntar se eu poderia mostrar-lhe como configurar um som de uma gaita de foles. Sem dizer uma palavra, eu configurei um para ele e pensei comigo mesmo que tudo o que ele tinha a fazer era ficar o cano da gaita no rabo - e assoprar.
O álbum, "Electronic Music", de George Harrison, foi lançado alguns meses depois. Mas não antes de eu entrar em contato com ele novamente e pedir para que meu nome fosse retirado da capa. Eu não tinha dinheiro para processá-lo. A retribuição adequada seria esperar por alguém mais corajoso e menos intimidado pelas tendências de Harrison para a cópia - como a pessoa que escreveu "My Sweet Lord" e perseguiu George até que o assunto fosse resolvido em tribunal, favorecendo o reclamante e penalizando Harrison com uma multa enorme por violação de direitos autorais. Em vez de reimprimir a capa do álbum, a Apple simplesmente pintou, com tinha prateada, sobre meu nome. Se você pode encontrar alguma das velhas edições do álbum, segure-a com a luz e você ainda poderá ver o meu nome - escrito incorretamente, claro. Apesar de eu ter crédito no interior do encarte - juntamente com seus gatos - eu nunca recebeu uma única ''libra". Além disso, o filho-da-puta nunca mais me convidou para ir a sua casa, para que eu pudesse mostrar-lhe o meu modo "sou-tão-humilde-como-Ravi-Shankar" que eu tenho praticado desde então.
Quando eu tentei contar a história para um repórter na revista Rolling Stone, o editor recusou porque Harrison era o seu herói da mídia no momento. Em vez disso, publicou uma história sobre George comprando calçados. Eles até se recusou a publicar o texto integral da minha carta para o editor, descrevendo o que havia acontecido, embora, depois de alguma pressão, eles finalmente a publicaram - de um forma muito editada - muitos meses mais tarde. Principalmente, na época, fiquei surpreso e confuso com a diferença entre a imagem de Harrison na mídia e a que eu presenciei no estúdio e na casa dele. Sua recusa em reconhecer a fonte de onde ele conseguiu o material expropriado me deixou frustrado e irritado, mas também com um sentimento de impotência, um pouco mais cínico e fez com que eu desse mais valor aos meus esforços. Eu tento entender a ganância e a necessidade sem fim pelo poder mas até hoje não tenho como aceitar que algumas pessoas sintam a necessidade de agir de forma oportunista em relação ao outro. Alguns membros da minha família não são exceção.
Quando eu tentei contar a história para um repórter na revista Rolling Stone, o editor recusou porque Harrison era o seu herói da mídia no momento. Em vez disso, publicou uma história sobre George comprando calçados. Eles até se recusou a publicar o texto integral da minha carta para o editor, descrevendo o que havia acontecido, embora, depois de alguma pressão, eles finalmente a publicaram - de um forma muito editada - muitos meses mais tarde. Principalmente, na época, fiquei surpreso e confuso com a diferença entre a imagem de Harrison na mídia e a que eu presenciei no estúdio e na casa dele. Sua recusa em reconhecer a fonte de onde ele conseguiu o material expropriado me deixou frustrado e irritado, mas também com um sentimento de impotência, um pouco mais cínico e fez com que eu desse mais valor aos meus esforços. Eu tento entender a ganância e a necessidade sem fim pelo poder mas até hoje não tenho como aceitar que algumas pessoas sintam a necessidade de agir de forma oportunista em relação ao outro. Alguns membros da minha família não são exceção.
Meu intercâmbio com Harrison foi especialmente decepcionante, porque eu tinha expectativas diferentes do que nossa relação poderia ter sido. Nesta época, eu era um sintetista confiante, um excelente programador e poderia ter sido útil caso o ambiente tivesse sido mais favorável. Os arrependimentos não duraram mais do que o tempo que levou para voltarmos ao nosso hotel. Eu tinha muito mais em minha mente - como o novo projeto com Paul, que incluia imortais do jazz e do blues como Gerry Mulligan, Howard Roberts, Mike Bloomfield, Leroy Vinnegar e Bud Shank - e de todos nós no mesmo grupo! Nós sonhávamos há muito tempo com a criação de canções que surgissem do ruído no ambiente nossa volta, começando explosiva e gradualmente e transformando a música em algo mais calmo e pacificamente, acabado em logos ecos, que iriam desaparecendo até que a última nota fosse ouvida.
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ASTRONAUTA - Onde você e Paul Beaver gravaram os cinco álbuns lançados por vocês (incluindo o "The Nonesuch Guide to Electronic Music")? Como era e como funcionava o estúdio Beaver & Krause, em Los Angeles?
BERNIE - Os dois primeiros álbuns, The Nonesuch Guide to Electronic Music e Ragnarok foram gravados basicamente no nosso estúdio Los Angeles. In A Wild Sanctuary, Gandharva e All Good Men são álbuns de estúdio, gravados em vários outros locais em Los Angeles e San Francisco.
Nosso estúdio de Los Angeles era equipado somente com um gravador de 8 pistas 3-M (com Dolby A) e, claro, um sintetizador Moog III. Era mais um armazém do que um estúdio de verdade, à prova de som. Então não era muito prático para gravação acústica ou gravação de orquestra. É por isso que, quando passamos a combinar os instrumentos tradicionais com o sintetizador, acabamos precisando de um estabelecimento melhor equipado. Isto explica o fato de gravarmos nossos álbuns posteriores em instalações maiores e mais acessíveis.
Nosso estúdio de Los Angeles era equipado somente com um gravador de 8 pistas 3-M (com Dolby A) e, claro, um sintetizador Moog III. Era mais um armazém do que um estúdio de verdade, à prova de som. Então não era muito prático para gravação acústica ou gravação de orquestra. É por isso que, quando passamos a combinar os instrumentos tradicionais com o sintetizador, acabamos precisando de um estabelecimento melhor equipado. Isto explica o fato de gravarmos nossos álbuns posteriores em instalações maiores e mais acessíveis.
ASTRONAUTA - Desde o final dos anos 60 você gravar os sons da natureza, tanto para seus álbuns, para trilhas sonoras de filmes e para seus arquivos. Eu li em algum lugar que você tem mais de 4.500 horas de sons da natureza e mais de 50 álbuns para download, com mais de 15.000 espécies registradas. Como é este processo de gravação? Que tipo de equipamento você usa para gravar? E você já veio (ou planeja vir) para o Brasil algum dia, para gravar algumas espécies?
Basically, my idea was to record whole natural soundscapes -- what I refer to as biophonies. These biophonies represent all of the living wild organisms that vocalize in any given natural habitat. So the equipment I use has always been some form of stereo. From the late 1960s to the mid-1980s the equipment was analog tape recorders -- technology that was typically very heavy and required lots of battery power to operate. In addition, audio tape was very heavy and weighed nearly .5kg per reel and lasted only 20 minutes. So you had to carry lots of heavy items into the field to record. In the mid-1980s the technologies began to change and became a bit lighter. It was a transition time from analog to digital with the DAT (digital audio tape) machines and of which we had the first versions to experiment with. Also, mic techniques were improving so that the systems were not so badly affected by humidity and wind. Just around that time Sennheiser introduced MS (Mid-Side) technologies that were great for the field and a vast improvement on earlier XY stereo versions. They are still used, today. Now I use a Sound Devices 722 or 744 digital audio recorder which records both to hard drive and compact disk (as a backup) at the same time.
BERNIE - Basicamente, a minha idéia era gravar todos os sons da natureza - o que eu chamo de biophonies. Estes biophonies representam todos os organismos vivos selvagens, que vocalizam em qualquer habitat natural. Assim, o equipamento que uso sempre foi estéreo, de alguma forma. A partir dos anos 1960 até meados dos anos 1980, o equipamento que eu usava eram gravadores analógicos - tecnologia que era tipicamente muito pesada e eram necessários várias baterias de energia para funcionar. Além disso, a fita de áudio era muito pesada, com cerca de 0,5 kg por bobina, e durava apenas 20 minutos. Então você tinha que carregar muito equipamento pesado para gravar no campo. Em meados dos anos 1980 as tecnologias começaram a mudar e se as coisas se tornaram um pouco mais leves. Era um tempo de transição do analógico para o digital com os gravadores de fita DAT (digital audio tape), os quais tinhamos as primeiras versões para experimentar. Além disso, as especificações técnicas dos microfone estavam melhorando para que os sistemas não fossem tão gravemente afetados pela umidade e vento. Mais ou menos neste período, a Sennheiser introduziu as tecnologias MS (Mid-Side), que trouxeram um grande avanço para a área e uma grande melhoria em relação às versões anteriores de estéreo XY. Eles ainda são utilizados, hoje em dia. Agora eu uso um gravador de áudio digital Sound Devices 722 ou 744, que registra tanto para o disco rígido quanto para o Compact Disk (como backup) ao mesmo tempo.
Meus microfones são uma combinação de Sennheiser MKH30 e MKH40, montados um em cima do outro e alojados em uma armação à prova de choque e em uma unidade de proteção contra o vento. Meus microfones de backup são DPA 4060 de lapela, que às vezes eu amarro em uma árvore, de modo que posso ter os microfones montados em 180°, um na frente do outro.
Estive no Brasil várias vezes, principalmente para gravar na região da Amazônia, em torno de Manaus. Eu tenho muitos amigos queridos aí (no Rio, em São Paulo e em Brasília), de modo que seria ótimo voltar algum dia. Eu amo o país.
ASTRONAUTA - Bem, obrigado, Bernie! É um prazer entrar em contato com você e uma honra para entrevistá-lo! Melhores desejos!
BERNIE - Obrigado, Astronauta. Por favor, saiba que o meu novo livro, The Great Animal Orchestra: Finding the Origins of Music in the World's Wild Places, está sendo traduzido para o Português e deve ser editado no Brasil no ano que vem. E por favor, perdoe o atraso na minha resposta e contate-me se houver alguma dúvida.
Ciao,
Novo livro do Bernie:
"The Great Animal Orchestra: Finding the Origins of Music in the World's Wild Places", por Bernie Krause (Little/Brown, Spring 2012)
http://www.hachettebookgroup.com/books_9780316192392_WhereToBuy.htm
Website:
http://www.wildsanctuary.com
Facebook:
http://wwwfacebook.com/TheGreatAnimalOrchestra
http://www.facebook.com/BernieKrauseAuthor
Twitter:
http://www.twitter.com/berniekrause
YouTube:
http://www.youtube.com/user/BernieKrauseTV
Email:
info@wildsanctuary.com
NOTA: Esta entrevista pode conter material (texto, áudio e/ou vídeo), que é propriedade da Wild Sanctuary, e protegido por direitos autorais. Qualquer cópia, mudança e distribuição comercial é proibida sem a devida autorização do escritório.
Ótima entrevista Astronauta, obrigado por compartilhar.
ReplyDeleteObrigado, Laerte!
DeleteIrado! Aguardamos a chegada do livro aqui no Brasil!
ReplyDeleteOi. O livro "A grande orquestra da natureza" foi lançado no Brasil finalmente, em setembro passado, pela Editora Zahar. Aqui está o link: http://www.zahar.com.br/livro/grande-orquestra-da-natureza
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